segunda-feira, 16 de abril de 2007

Quando 1 quilômetro não são 1000 metros. (Parte III)


A corrida segue é os metros se sucedem. Agora, eles parecem todos iguais, cópias idênticas da barra de platina, que ainda hoje é conservada no Bureau Internacional de Pesos e Medidas, na França. Venço as placas de 4, 5 e 6 quilômetros. Percorro um caminho conhecido, traçado quase que diariamente para levar meu filho à escola. Penso curioso: “os postes parecem mais próximo um dos outros quando passo de carro”. Antes de completar os 7.000 metros, aumenta o fluxo de corredores no sentido contrário. São corredores com mais experiência, mais perna e mais fôlego que já estão completando os 12.000 metros. Ai que inveja!

Sigo em frente, o fluxo crescente de atletas no sentido contrário entrega que o retorno está perto. Sou tomado por uma nova onda de euforia e ansiedade. A placa dos 9Km está perto. Depois dela é retornar no mesmo caminho da vinda, sem surpresas, os mesmo quilômetros idênticos à barra de platina. Uirruu! Finalmente a placa dos 9Km, com ela o retorno e com ele um tapete azul que registra o tempo parcial. De novo ouço os bips e lembro da largada, 45 minutos atrás.

É hora de beber mais água. Desta vez pego dois copinhos. O primeiro tomo junto com um sache de carboidratos (coisa mais doce que o doce de batata-doce), o segundo jogo nos ombros e no pescoço para refrescar um pouco o corpo. Daqui em diante, todo copo de água será bem vindo.

Agora é minha vez de ver os rostos de inveja. Passei para o grupo dos que estão voltando e me animo. Reconheço algumas caras. Um antigo aluno, também corredor, me saúda – “Vai lá fessor!”. O danado passa por mim, como se fosse uma flecha. Por algum tempo, fico imaginando se não seria mais fácil se tivesse uns 12 anos a menos. Olho para lado é vejo um senhor de cabelos brancos, cobertos por um boné amarelo, em passo ritmado, correndo ao lado de uma jovem que pedala uma bicicleta. Será sua filha? Será sua amiga? Será sua mulher? Acompanho-os por alguns momentos, vencemos juntos a placa dos 11 Km, mas depois deixo-os para trás. Antes da separação um asceno, ficamos amigos de quilômetros.

A companhia silenciosa daquele casal me provocou saudades da minha família. Passo a procurar nas sombras das árvores a silhueta da minha mulher e do meu filho. Um grito da torcida particular para animar viria bem. Vi uma mulher com uma criança pequena espichando o pescoço para depois dar um pulo e gritar – “é o papai lá!”. Olhando pela ponta do olho tive a impressão de ver aquele pai sorrindo ao ser acompanhado por aquelas pequenas pernas que logo se cansaram.

Chego aos 15.000 metros. Estou novamente na boca do Buraco do Tatu. É hora de me despedir da Asa Sul e voltar para casa. O que antes era subida se transformou em descida, o que guarda uma irônica semelhança com a vida, não é mesmo? Uma brisa correu o ambiente e senti a irresistível vontade de soltar o corpo, abrir os passos e aumentar a amplitude das passadas. Mais uma vez fui tomado por aquela sensação de euforia, foi um breve retorno às corridas da infância. O flash-back infantil teve seu preço e senti levemente uma pontada no posterior da coxa. Só faltava essa. “Presta atenção no serviço, rapaz!!”

(tem mais um pouquinho...)

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